Ave César: os que vão morrer te saúdam!

casarãoPor Adriano Pereira

Quanto mais sonho

Cachoeira

Mais acordo

Valença

(GlobalizaCão – Damário revisitado)

Faz um mês que não piso em Valença.  Longe da terra onde nasci (pelas mãos de Mustafá – o velho médico e poeta, patrimônio imaterial de nosso rincão), “há milhas e milhas distante”, exilado, por necessidade, “por que se ficasse, estaria carregando bujão” (como ouvi semestre passado de um formando valenciano); movido pela saudade, caminho pela ‘heroica’ cidade de Cachoeira, pelo seu antigo casario; re-vejo na praça os postes de iluminação onde se pode ler “Valença Industrial – 1888”; estendo à vista às margens do Paraguaçu, avisto São Félix; lembro que, historicamente, ‘a decidida’ também é recôncavo e sonho com Valença.

Num sonho feliz de cidade/ longe da maldade/ Entrando num novo horizonte/ Mais um passo/ Águas de Março/ Inocente, cruzo a ponte/ Chego ao cais/ Saudade me atrai…/ Caminho pela Graça/ Paro na praça/ Urbis, Vila Operária/ Subo uma muralha/ Dou num largo adro/ Festa do Sagrado/ Baixa Alegre Tamarineiro/ Ou mesmo no Jambeiro/ Rua das Flores no Centro/ Que una-se Tento/ Mangue seco – Beira Mar/ Numa vila, boa esperança/ Numa grande festança…

Daí, acordo e vejo que Valença continua dormindo. “Dormia a nossa pátria, tão distraída, sem perceber que era subtraída em tenebrosas transações”. A maioria dos seus filhos e filhas, meus irmãos, sofrem pesadelos. Mudaram alguns nomes, mas tudo continua como dantes… Não. Não vou falar do “novo” secretário de juventude, cujo primeiro projeto, com o apoio da Câmara (“A câmara, não acode?” – Gregório de Matos, boca do inferno), trata-se na verdade de mais do mesmo: parlamento jovem para estimular a cidadania. Pergunto: cidadania para quem, cara pálida, quando a juventude negra, fora da escola, com a UFRB na promessa, sem emprego, enfiada na lama, perde a cabeça e encurta a vida nas pedras do caminho?

“Se o velho não pode cuidar de suas rugas, o novo já nasce velho”. Cuidemos do velho, então, por que, se como grafou o maluco beleza, ”é preciso cultura pra cuspir na estrutura”, aqui sobra. Ainda que abandonada, desprezada, mal cuidada, desmoronando… Refiro-me ao nosso patrimônio histórico, que na crônica de uma morte anunciada, vem de-caindo. Essa semana espalhou-se na rede fotografias do antigo casarão da finada Rute. Na esquina da Avenida 7 de Setembro, o monumento agoniza. Mas não é o único. E já vem sendo denunciada em verso e prosa por gente muito mais importante que eu. Pela professora Rosângela Góes, pelo Doutor Francisco Neto, pelo mestre Moacir Saraiva… Em 2013, de forma amadora, com uma câmera fotográfica, por conta própria, fotografei as inúmeras fachadas das antigas construções valencianas. A ideia era expô-las a fim de chamar atenção para a destruição do nosso patrimônio. Por falta de recursos e apoio a exposição não ocorreu. Mas guardo comigo as imagens, inclusive de alguns que já foram ao chão.

Na Praça da República, além dos casarões, há outro prédio que chama a atenção pela imponência e importância. Já foi sede da Rádio Clube, do SESI, cinema… Mas sua fachada, de 1910, não deixa margem: Teatro Municipal. Apesar de um pouco descaracterizado, o prédio abriga a memória coletiva da cidade. Ano passado, nosso grupo, com o apoio da incansável professora Edna Xavier, teve a ousadia de reabri-lo. E, ainda que inadequadamente, a população pôde adentra-lo, conhecer suas dependências e assistir um espetáculo teatral, além de uma exposição de artes visuais. Retumba ainda nos ouvidos dos que estiveram presentes, o brado do velho Mustafá, como nosso porta-voz, ao receber a comenda Macária Andrade: prefeita: Devolva esse teatro aos valencianos!

Quando fiz parte do Conselho Municipal de Cultura, uma das propostas discutidas foi a mudança das secretarias de Turismo e Cultura para o Teatro Municipal, já que a mesma funciona num prédio alugado. O dinheiro do aluguel serviria como recurso para uma reforma gradativa do mesmo. Até agora isso não aconteceu. Com a mudança de cadeiras no secretariado, a ex-secretária de Turismo, Aline, foi para a Cultura e Júlio César foi para o Turismo. Conheço Júlio desde o tempo do Movimento Estudantil, quando ele, dedo em riste, gritava palavras de ordens e nós fazíamos coro. Os tempos são outros, muita coisa mudou. Dizem que Júlio mudou de lado… Quanto a mim, estou na “terceira margem”, mas sempre tive com Júlio uma relação respeitosa. Por isso arrisco fazer-lhe, publicamente, um apelo, urgente, vez que vi no seu facebook que há uma intenção de recuperar a ex-secretaria de Turismo. Uma imitação barata que o faraó Ramiro ergueu na entrada da cidade. Se vão gastar dinheiro, por que não no teatro? Assim, Júlio César, que já tem na história seu nome, escreverá mais uma página digna de ser lida sobre a cultura, não apenas para turista ver, mas, também, para os valencianos.

 

*Adriano Pereira, escritor, poeta e agitador cultural valenciano, atualmente, graduando em História na UFRB.

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14 Resultados

  1. anderson disse:

    Belo escrito. Parabéns, Adriano!

  2. Moradora da rua 1º de março disse:

    Esse casarão está prestes a causar um desastre! Passo aí todos os dias com medo de um acidente fatal, pois as paredes estão para despencar!!! O fluxo de veículos pesado que passa nessa rua é grande. Solicito a Prefeitura que adote as providencias cabíveis para resolver essa situação, pois o herdeiro e atual dono, que é médico de boas condições financeiras, parece não enxergar essa calamidade. O sobrinho que é engenheiro também conhece o problema.

  3. IRENE DÓRES disse:

    Adriano lindo esse seu texto, com citações sábias do Chico Buarque e outros poetas. Mas o que quero dizer mesmo é que a briga pela preservação do patrimônio público a qual nós vivênciamos desde a década de 1980 parece que nunca foi e nunca será ouvida. Pois não há nada que que nós os artistas possamos fazer para que os políticos nos ouçam, parecem que eles são surdos.
    Quanto ao sobrado da família Borges, sendo ele propriedade particular, cabe a esses proprietários demolir logo o imóvel para evitar desastre e prejuizo a terceiros.

  4. Matheus Oliveira disse:

    A pior coisa é despeito!!! rsrsrsrsrsrssr

  5. MENSALÃO disse:

    Quem prometeu URFB pra Valença foi seu candidato a prefeito derrotado viu DRICA!!! Que anunciou e depois o Ministro da Educação hj prefeito de São Paulo disse que Valença nunca entrou na discussão. Mas vcs são assim mesmo, do contra. Os chamados “Virgens” da ética e moralidade

  6. Aluado disse:

    Rapaz parece que esse moço tá usando alguma substancia!!!
    Universidade Federal quem constrói é o Governo Federal. Ai se fala em força politica, Wagner Preguiça e Dilma determinou recursos para fazer a de Cachoeira. Em Valença deveria ser dá mesma forma!! cade os Índios tirados a Caciques do PTzinho??? Só tem força ou prioridade para garantir o emprego da Cansanção??? rsrsrssr

  7. Só rindo disse:

    martiniano é o pai da UFRB com certeza se não fosse ele quando era vereador e com a ajuda de josias que era deputado federal na época, Valença nunca estaria na legislação que contempla a nossa cidade. valença nem era reconcavo mas ele conseguiu colocar Valença no projeto mesmo assim. só que ele não é prefeito. nunca foi. e pra universidade federal vim pra valença tem que ter um prefeito retado, competente e bem articulado. é muito fácil ganhar a eleição e reclamar que as coisas são difíceis. às vezes quando jucelia fala eu tenho a impressao que ela é prefeita sem querer ser. porque ela diz tanta coisa que não dá pra fazer reclama de tantas dificuldades. então porque se candidatou? nao quis ser prefeita prometendo que ia fazer? então agora faça e não fique dizendo que os outros não fazem. esse comentario aí é os assesores dela que fazem. tipico deles.
    só o que faltava culpar quem não é prefeito pela a espera da ufrb.

  8. Me deixe disse:

    Aluado voce é aluado mesmo. Muito engraçado…Na hora de dizer que as obras do estado sao suas fazem isso direitinho, as maquinas do estado, o samu do estado, o sac do estado a prefeitura diz ‘eu que fiz’ ‘eu que trouxe’ Isso todo mundo sabe fazer.

    aí quando não tem competencia pra trazer a ufrb diz que é o governo federal que tem que trazer. Me deixe…

    na hora de anunciar as creches o pronatec as casas populares do governo federal de Dilma como se fosse da prefeitura sabem. Me deixeeeeeee viu?

  9. Zai Pereira disse:

    Parabéns pelo texto, pelas citações, pelo apelo. Sinto muito pelos desavisados que culpam unicamente o PT pela ausência do campus ufrb em Valença. Sem saber que foi o Pt que abraçou essa bandeira e que até hoje Valença ainda não tem a ufrb por falta de força política! Agora soube que estão dando prioridade a uma faculdade pública! Até aonde sei, o governo federal está aguardando o terreno da prefeitura, mas esta não parece estar tão interessada assim…

  10. Zai Pereira disse:

    Prioridade a uma faculdade particular!*

  11. Maximiniano disse:

    Não podemos permitir que mais um casarão venha para o chão.
    Já chega a casa da finada Leonor Queiróz da ladeira do porto que transformaram naquele predião/ E o casario onde a Srª Clarice Serafim morava ali perto do hospital… Triste Valença, com governo “cara de pau” que fala tanto em preservar, conservar … e não fazem outra coisa a não ser se acomodar!

  12. história disse:

    Que coisa viu!! Prédio particular querendo q a prefeitura administre? Falar igual a Chaves “Que Burro, dá Zero pra ele professor” Pq sua família vendeu a casa na rua direita? Por ser também um imóvel com mais de 50 anos não deveria desmanchar

  13. Adriano disse:

    É mais eu sou assim
    sem papas na língua meu bom
    camarada, não sou caô caô
    nem conversa afiada e
    também detesto caguetação

    Sei que na minha ausência
    os invejosos me malham sem
    pena e sem dó, eles dizem
    até que eu fumo maconha
    que ando com a venta
    entupida de pó

    O que vem de baixo não
    me atinge, o meu sucesso
    incomoda muita gente,
    está provado que este
    monte de inveja, ele
    é mesmo a arma do
    incompetente

    (Bezerra da Silva – Partideiro Indigesto)

    Acho engraçado esses comentaristas que se escondem em pseudônimos “criativos” e sem argumentos apelam pra desqualificação pessoal rasteira e mentirosa. Martiniano, não prometeu a UFRB pra Valença. Lutou e assegurou através de Josias que na lei de criação da universidade Valença fosse incluída, assim como Nazaré. Isto não aconteceu por interesses contrários desde 2005. Está na lei, quem quiser vá pesquisar. Quando Hadad assumiu e foi cobrado pelo campus de Valença num documento entregue em Cruz das Almas, por Salete, então presidente da APLB, tinha assumido recentemente o ministério, daí o seu desconhecimento. Sim, quem constrói e mantém a universidade é o governo federal. Mas era preciso, que o município, minimamente, doasse o terreno, fato que não ocorreu.Já se vão 3 gestões. Não tenho dúvidas que se o PT tivesse saído vitorioso nas eleições municipais, a UFRB, assim como outras ações já estariam acontecendo em Valença. Eu, assim como Pelegrini, Matheus, somos PeTistas, assumimos o que fazemos, de peito aberto e muitas vezes tomamos na cara também. Espero que o Aluado e Mensalão assumam-se e entrem na luta por mais cultura pra nossa cidade que é a recuperação do Teatro, foco deste artigo, sobre o qual os mesmos não disseram uma palavra.
    Peço desculpas por não tecer comentários mais elaborados, pois preciso voltar a estudar, enquanto outros entorpecem-se com drogas lícitas e ilícitas (oxalá não sejam compradas com dinheiro público desviado) para dos seus celulares de última geração destilarem seu ódio ao partido que está tirando seus privilégios…

  14. Ricardo Vidal disse:

    Adrianosky Pereira, fico feliz que o seu artigo esteja sendo comentado e fazendo as pessoas se darem conta sobre a desagregação que conta o patrimônio histórico-cultural de nossa cidade. Imagino que, se mais pessoas continuassem bombardeando os jornais e os blogues de nossa cidade sobre esse assunto, quiçá o nosso poder público (Prefeitura e Câmara Municipal de Valença) ACORDEM para o assunto. Não falarei do resgate de livros antigos escrito por valencianos (como os de Fábio Luz e Galvão de Queiroz), que seria outra ação interessante – mas reforço a essência de seu texto. VALENÇA PRECISA PRESERVAR MAIS SUA HISTÓRIA E SUA CULTURA. ELA É RICA E, NO ENTANTO, DESPREZADA. FALTAM POLÍTICAS PÚBLICAS SÉRIAS PARA O SETOR. Agora, se me permites um naco de sinceridade: Só temo que, diante da grandeza do tema tratado (a preservação de nosso patrimônio arquitetônico), as pessoas de direito que podem fazem alguma coisa só se atenham para um fato menor (transformar o prédio do Teatro Municipal em sede da Secretaria Municipal de Turismo). Temo não só a miopia de achar que “Cultura” (eventos?) seja apêndice de “Turismo”, como perdermos de vez um importante espaço cultural, como mero ambiente burocrático.

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