As “terras do Una”: homenagens e reflexões

Por Jorge Amorim*

jorge amorim Ao atravessarmos a ponte que liga os municípios baianos de Jaguaripe e Valença, ou vice-versa, nossos olhos são magnetizados pela exuberância restante da mata Atlântica que é cortada pelo rio Jiquiriçá, o qual é responsável por guardar naquele trecho de águas uma pequena ilha fluvial. E quão bela é aquela ilhota! Ali perto, vê-se ao lado da rodovia BA-001 uma placa indicando a entrada para as “RUÍNAS DA IGREJA DE STº ANTÔNIO”, templo construído em 1720 juntamente com a freguesia de Santo Antônio dos Prazeres do Jiquiriçá.

Deixemos sob interrogação ao caro leitor ou a cara leitora, por um momento, quanto a essa capela ao popular “santo casamenteiro”. Como foi edificado nos primeiros anos do século XVIII nas proximidades do rio Jiquiriçá, caminho de água para os exploradores europeus que por ali passavam abastecedor de engenhos e fazendas, aquele templo pode ter sido o embrião da religiosidade católica na região valenciana e o da veneração a Santo Antônio, antecedendo assim as homenagens a Nossa Senhora do Amparo, atual padroeira do município. Com suas paredes de adobe colossais, o pequeno templo deixa uma atmosfera de “mistério” histórico.

Segundo o professor Edgard Oliveira no livro “Valença: dos primórdios à contemporaneidade”, sobre um monte que ficava à margem direita do rio Una foi construída a capela do Amparo pelo missionário frei Bernardino de Milão. Era o ano de 1750. Quarenta e nove anos depois, em 1799, devido “ao grande progresso e desenvolvimento econômico e populacional” do povoado de Una, nascido à sombra da cruz católica da igreja de Nossa Senhora do Amparo, o desembargador Baltazar da Silva Lisboa, da então comarca de Ilhéus, propôs ao governador da capitania da Bahia Fernando José de Portugal (1788-1801) a elevação daquele povoado à posição de vila.

Em 10 de junho de 1799, as “terras do Una” passaram a ter autonomia do município de Cairú, sua terra-mãe, com a eleição de conselheiros locais – os vereadores de hoje –, a indicação de juízes, escrivães e um capitão-mor. E mais, aquelas “terras” adquiriram o nome de vila de Nova Valença. A homenagem desta denominação foi a Afonso Miguel de Portugal e Castro, governador da capitania da Bahia entre 1779 e 1783 que levava o título nobre de 4º marquês de Valença, cidade localizada ao norte de Portugal. Foi durante o governo do 4º marquês de Valença que a localidade das “terras do Una” obteve “estradas para o sertão”, “a cultura do arroz” e “a cultura do café”.

Preitos à parte, em cinquenta anos a vila de Nova Valença subiu o degrau administrativo chegando à categoria de cidade com a denominação de Cidade Industrial de Valença em 10 de novembro de 1849, data até hoje comemorada como a da emancipação político-administrativa de Valença. É bom chamarmos a atenção da cara leitora ou do caro leitor para o termo “Cidade Industrial”, pois foi a partir do século XIX que Valença adquiriu positiva relevância na área da indústria têxtil.

Para termos uma noção exata disto, o historiador Luís Henrique Dias Tavares diz em sua obra “História da Bahia” que a fábrica de tecidos Todos os Santos, propriedade do comendador e comerciante de escravos Antônio Pedroso de Albuquerque, localizada em Valença, estava entre as sete principais da Bahia. Entrando no século XX, a fábrica de tecidos Nossa Senhora do Amparo, pertencente à notória Companhia Valença Industrial (CVI), era a mais importante e única do interior baiano, de modo que outras oito fábricas têxteis concentravam-se em Salvador.

O economista Rômulo Almeida (1914-1988), autor do clássico artigo intitulado “Traços da história econômica da Bahia no último século e meio”, chega a afirmar neste trabalho acadêmico que a fábrica têxtil de Valença ficou conhecida como a melhor, quiçá, “em todo o Império e talvez Sul América”. Portanto, observamos o quanto a industrialização deve ser incentivada em nossa atualidade, partindo de uma questão muito simples: Valença precisa revitalizá-la, sendo este uma das suas fortes inclinações, complementada com a sua forte tendência turística natural caracterizada por suas praias, resquício de mata Atlântica e história.

Com estas homenagens, por nós aqui realizadas, a Valença que ainda possui um belíssimo casario secular de preciosidade arquitetônica às margens do rio Una e que presenteou – e presenteia – a Bahia, o Brasil e o mundo com personalidades excepcionais, merece ser presenteada com mais zelo à sua história por parte dos seus representantes políticos e da população.

PARABÉNS VALENÇA POR SEUS 164 ANIVERSÁRIOS!

*Jorge Amorim é professor da Faculdade de Ciências Educacionais (FACE, Valença), da Faculdade Eugênio Gomes (FAEG, Ipirá) e mestre em História Contemporânea pela Universidade de Lisboa, Portugal.

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7 Resultados

  1. ane disse:

    Esse cara manda muito bem!!

  2. Patrícia Guedes disse:

    Parabéns ao autor e parabéns a Valença, terra que dia após dia gosto mais. Com certeza temos que zelar, afinal quem ama cuida.

    Só uma observação:
    De acordo com o Memorial da Câmara Municipal de Valença, também existe outra versão da origem do nome Valença para o município, segue:

    A denominação Valença foi atribuída, segundo reza a tradição popular, por estes novos moradores¹ , para os quais a localidade representava a solução para os seus problemas,Terra da Valença, da salvação.

    ¹Habitantes das ilhas próximas que viviam em constante enfrentamento com os índios.

    Abraço!

  3. Ana disse:

    Parabéns pelo texto.Abraços!

  4. Carol disse:

    Parabéns pelo texto.Abraços!!

  5. BETO disse:

    Caro professor gostei muito do texto, mas vale ressaltar que as pessoas acreditam que a padroeira da cidade seria Nossa Senhora do Amparo, mas conduto lhe digo que o padroeiro da cidade é sim o Sagrado Coração de Jesus.
    Atenciosamente.

  6. cemat disse:

    Não adianta discutir se a padroeira é Nossa Senhora do Amparo, ou Sagrado Coração de Jesus,infelizmente nosso país não tem memória, é praticamente um história destorcida desde os primórdios, que descobriu o Brasil foi os Portugueses, foi os índios, sempre surgia essa dúvida,falta de memória, até hoje na cabeça de alguns Brasileiros, os Portugueses são Burrinhos, e foi que levaram nossas riquezas.
    Governantes não cuidaram dessa parte, até hoje construções centenárias são destruídas sem muito questionamentos, e no local nasce um construção de prédios modernos, com objetivo único e exclusivos, de exploração comercial.
    Alias, nosso tão imenso Brasil não tinha memória há pouco tempo, na crise financeira plano color verão 1988, o governo não sabia quanto arrecadava, nem o que tinha a pagar, até os desvios de recursos não tinha noção do rombo. só assim o FMI passou administrar nossas contas, afinal eu tenho que depois tirar o meu, assim pensou o FMI.
    Imaginem se nossos Governantes pensaram e selar pelo nosso patrimônio histórico, que hoje encontram-se em ruínas.

  7. cemat disse:

    Onde se lê “selar, leia-se Zelar

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